Ângela e
Raul estão casados há mais de 50 anos. Apaixonados, ficam de mãos
dadas, trocam olhares, falam coisas como estava
aqui olhando a Ângela e me lembrei daquela frase que se dizia no meu tempo, ela
é uma uva! Ah, ela é uma uva até hoje!
-Benzãozinho,
que que você disse?... Deixa pra lá, vou fazer seu doce para o almoço.
Casaram-se
numa linda igreja e fizeram uma festa memorável. As fotos do álbum de
casamento, volta e meia, aparecem nas rodas de conversa, quando contam
histórias do passado. As histórias da Ângela são de fazer a pessoa se
escangalhar de rir ou chorar de tanta emoção.
Ela pega a máquina de calcular para digitar o número de telefone da farmácia; abre a janela e fala alô?! Ah, Angelinela, Nenela, que cabeça! Ao lado disto, se põe bonita para a feira, para o trabalho ou para o teatro, tem a casa
arrumada no detalhe, nas flores frescas, na toalha da mesa. Não deixa faltar
uma palavra de afeto para o vizinho de rua, para o dono da venda.
Ela é do tipo
que despeja amor e riso como chuva de uma sempre primavera.
Ele é do
tipo sossegado, aventureiro, arredio à cidade grande; por profissão conhecedor
do mato, da natureza, dos bichos, já se curou de 9 maleitas, nada o tira do
sério.
Amando-se
como se amam por muitos anos viveram a se dizer até a volta, se cuida, nos
vemos no Natal... Trabalharam
muito duro os dois para construir a vida, criar os filhos.
Para as
Bodas de Ouro, sonharam anos seguidos. O sonho era assim: A capela da PUC de
São Paulo, toda enfeitada, ela estaria vestida em lilás, muito elegante, e
entraria na nave pelos braços do neto Rafael, um rapaz muito lindo. No altar,
estaria o marido ladeado pelos três filhos, noras e os outros netos que, com
certeza, já teriam. A Ave Maria de Gounod soaria quando ela e Rafael - que
jamais teria morrido naquele horrível desastre de automóvel - entrassem pelo
tapete da nave principal, olhando os convidados, os amigos, os parentes,
sorrindo para todos. Na cerimônia, o marido a presentearia com uma aliança de
brilhantes e, ao final, haveria uma festa.
A vida nem
sempre segue nossos planos.
Nosso é
apenas o presente.
No dia das
bodas foram à missa na capela do convento das franciscanas, no bairro de São
Francisco, em São Sebastião,
cidade do litoral.
Presentes apenas o casal e os três filhos. Nem uma nora, nem um neto. Sentaram-se juntos, do lado esquerdo da igreja. Do lado direito, uma família de gente simples rezava pelo filho que morrera atropelado. O padre veio lhes perguntar o motivo da presença ali. Explicaram que eram bodas de ouro. Foram efusivamente felicitados. Fez o mesmo com a família ao lado e ofereceu-lhes seu conforto. A missa foi singela. Aqueceram-lhes as palavras do padre. Com um sentimento de união, caminharam para a saída igreja. Do nada, entra pela nave, um garotinho desconhecido. Sorriso de orelha a orelha, ele abraça a noiva. Inunda-a de ternura. Como teria feito o neto querido. Bençãos do céu.
fotos em PB do Studio Perlaky - 1954 - restauradas pelo Remo
fotos de S. Sebastião 2012 - Remo