Desde que as filhas ficaram grávidas, muito meninas, a mãe começou a adoecer. As garotas tiveram seus filhos morando em casa dos pais. A patroa não gostara nada daquilo. Primeiro porque as meninas nunca haviam se empenhado em aprender grande coisa; mal iam à escola e pouco ajudavam os pais. Agora, cada uma com um filho nos braços, mais precisavam de ajuda do que podiam ajudar em alguma coisa. Dona Ester ficou possessa quando descobriu que Lidinha já tinha posto barriga, de novo. Chamou a caseira, o caseiro, disse o que pensava e avisou: “Não quero mais estas meninas aqui em casa e também não quero homem nenhum entrando no sítio, pra falar com elas. Se escolheram esta vida, podem vivê-la. Onde quiserem. Aqui, não!”
Os dois balançaram a cabeça, até concordaram com a patroa.
Entretanto.
Coração de mãe principiou apertar. Deu de falar sozinha, a Rosa. Ia para a horta e ali despejava suas lágrimas, regando as folhas de escarola, de alface, os pés de berinjela. Para onde iriam as meninas? Como fazer com os netos que cresciam? Do que elas iam viver? Os pais das crianças não iam arcar com despesa nenhuma, alegavam desemprego. Rosa não tinha resposta para nada, não tinha solução. As filhas sempre foram meio bobas, nunca souberam aproveitar as oportunidades que tiveram para aprender uma profissão. Nunca foram atrás de nada. “A não ser de homem!” – gritou ela, furiosa. “Nasceram para ser putas”. Será que existe isto? – pensava Rosa soluçando entre os ramos de tomate.
Dona Ester e Seu Leandro também se preocupavam mas diziam que não tinham nada a ver com aquilo. Seus empregados eram os caseiros, não suas filhas e netos. “Pagamos todos os direitos deles! Já basta!”
Antenor, o marido de Rosa, era um homem trabalhador, muito responsável, religioso. Só não foi capaz de segurar as filhas. E agora?
Eles tinham uma casinha na cidade, estava alugada. O dinheiro do aluguel foi sempre uma boa ajuda. Teria que pedir a casa e colocar as filhas lá dentro. Perderia dinheiro, gastaria ainda mais.
Ele foi ficando perturbado. Mas não se dava conta do sentimento que brotava em seu peito. Não era certo ter raiva. Não era coisa de cristão. Um dia surgiu uma dor no estômago, forte demais. Uma pontada, um puxão. Não teve força para gritar. Rosa vinha subindo da horta quando o viu desabado no chão do galinheiro, as angolas cacarejando indiferentes. Largou as verduras em qualquer lugar, correu para atender o marido. Tinha raiva dele também, misturada com amor, com desencanto, e tudo se mesclava no abraço que lhe deu, levantando-o sem pensar e carregando-o até a cama. As filhas não estavam, tinham levado as crianças para vacinar. Os patrões, na cidade. Antenor não falava, respirava ofegante. Ela ligou para a patroa que voltou para o sítio num instante e já com uma ambulância. Antenor foi atendido a tempo, tinha era uma úlcera que precisou ser operada às pressas. Raiva.
continua na próxima semana
foto da internet
Só na smana q vem? Já estou curiosa...
ResponderExcluirElisa
é assim que os escritores enxergam as histórias da vida e elas ficam infinitamente melhor.
ResponderExcluirbj
ti
melhores...
ResponderExcluirQue texto lindo!
ResponderExcluirUxa, adorei seus textos! Está se mostrando grande escritora!
ResponderExcluirSueli Oliveira
Gostei muito dessa sua idéia da Raiva em 03 capítulos.
ResponderExcluirFica curioso. E eu fico leitora curiosa.
Rosa e Antenor estão personagens para ninguém botar defeito.
Cheios de vida. Os dois embrulhados no amor às filhas.
Embrulhados, balançados, contraditórios.
Como são os pais na vida, não é mesmo?
Foi prá lá de bom ler esse primeiro capítulo.
Aguardo os próximos.
Parabéns, meu abraço.
Até mais,
Cibele
Adorei!
ResponderExcluirbjs
Bel